Leia o artigo de opinião da autoria de Luís Lapão, do ACES Arco Ribeirinho, Centro Hospitalar Barreiro-Montijo e Universidade Nova de Lisboa, acerca do seu projeto Keratinocyte cancer prevention at primary healthcare centers in Portugal, um dos seis trabalhos distinguidos com uma bolsa de investigação clínica em Oncologia nos Cuidados de Saúde Primários. As bolsas de investigação clínica em Oncologia nos Cuidados de Saúde Primários, que resultaram de uma iniciativa conjunta da Liga Portuguesa Contra o Cancro (LPCC) e da Agência de Investigação Clínica e Inovação Biomédica (AICIB), foram entregues no dia 5 de julho, durante uma cerimónia oficial, que teve lugar no Auditório do Centro de Saúde de Sete Rios, em Lisboa. Saiba mais aqui.
Hoje sabe-se da importância e do papel dos Cuidados de Saúde Primários (CSP) na prevenção do cancro, nomeadamente naqueles onde o comportamento das pessoas é um factor de risco. Tem sido feito um bom trabalho ao longo dos últimos anos na redução do tabagismo, por exemplo, mas também se pode actuar ao nível da protecção contra os cancros da pele. Este projecto resultante da colaboração entre a Universidade Nova de Lisboa, o ACES Arco Ribeirinho e o Centro Hospitalar Barreiro Montijo, pretende, em primeiro lugar, estimar a incidência de cancro da pele (não melanoma) na população do Arco Ribeirinho e Centro Hospitalar Barreiro-Montijo devido à exposição solar de lazer (e.g., resultante de actividades de lazer, como ir à praia ou passear na marginal) ou à exposição solar ocupacional, ou crónica (e.g., actividade profissional, como os jardineiros).
Como segundo objectivo, identificar o percurso do doente com não melanoma dentro do ACES e do centro hospitalar. E em terceiro lugar, aproveitar para potenciar as novas tecnologias digitais para desenvolver uma plataforma para capacitação para os médicos de família sobre exposição à radiação solar ultravioleta e prevenção do cancro de pele. Da ciência sabemos que a exposição à radiação solar ultravioleta é o factor de risco mais importante para o desenvolvimento de carcinoma de queratinócitos (KC) (Loney et al, 2021). O mais importante é que este tipo de cancro apresenta a quarta maior incidência do mundo em 2020 (Sung et al, 2021), sendo, portanto, um grave problema de saúde das populações. Mais ainda, quando a sua prevalência aumentou 310 % entre 1990-2017, representando o maior aumento entre qualquer neoplasia rastreada pela Carga Global de Doenças (Urban et al. 2019). O crescente aumento da incidência do cancro de pele ao longo dos anos tornou-o também num importante problema de saúde pública (Loney et al, 2021).
Com base nesta bolsa, estamos a montar um projecto onde esperamos alcançar os seguintes resultados: Pela primeira vez estimar o número quantificável de pessoas diagnosticadas com não melanoma devido à exposição solar intermitente (e.g., resultante de actividades de lazer) ou crónica (e.g., actividade profissional) aos raios UV, e contributo para uma melhor compreensão da epidemiologia deste cancro em Portugal. Ao mesmo tempo que envolvemos os médicos de Medicina Geral e Familiar na prevenção primária do cancro da pele nos serviços de cuidados de saúde primários e melhorar a colaboração com a Unidade de Investigação Clínica do CHBM. Pretendemos também melhorar o reconhecimento das doenças de pele pelos profissionais de saúde que actuam nos cuidados de saúde primários.
Em termos de organização dos serviços, esperamos propor um novo caminho clínico bem alinhado para fornecer uma resposta mais rápida entre os centros de saúde e o centro hospitalar no combate às doenças de pele, aproveitando as ferramentas digitais. Iremos também inovar quanto ao uso das plataformas digitais, eventualmente, se os dados o permitirem fazer alguns testes com recurso a tecnologias de inteligência artificial. Em conjunto, esperamos melhorar a implementação de medidas de políticas públicas relacionadas com a saúde da pele, como conseguir aumentar o número de pessoas que utilizam medidas de protecção individual contra a radiação solar ultravioleta, a nível do lazer e ocupacional.
É importante ter em mente que, com o aquecimento global, a exposição ao Sol pode ser significativa mesmo na primavera ou outono. Por fim, é muito importante promover mais investigação no contexto dos Cuidados de Saúde Primários, nomeadamente para melhor responder ao desafio da cobertura universal da saúde proposto pela Organização Mundial de Saúde. Este projecto que resulta da colaboração próxima entre a Universidade e os centros de saúde é crucial neste processo, mais ainda quando une a experiência da UNIDEMI (área da engenharia e saúde digital) com a Nova Medical School, dentro da Universidade Nova de Lisboa para promover soluções digitais inovadoras na área da saúde.
A atual pressão que se coloca nos Cuidados de Saúde Primários (CSP) em Portugal é um presente envenenado para os seus utentes e profissionais de saúde.