Rui Cernadas: questões para pensar
DATA
25/11/2014 09:44:04
AUTOR
Jornal Médico
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Rui Cernadas: questões para pensar

[caption id="attachment_6762" align="alignnone" width="300"]ruicernadas Rui Cernadas - Este endereço de email está protegido contra piratas. Necessita ativar o JavaScript para o visualizar.[/caption]

Os Cuidados de Saúde Primários (CSP) precisam de se repensar numa perspectiva de seguir a evolução da sociedade que servem.

Esta reflexão deverá visar dois grandes objectivos:

1. Centrar interesses e visão no cidadão enquanto utente e indivíduo que paga ­­­– e bem – impostos e contribuições;

2. Reposicionar agora a qualidade num patamar já não exclusivamente organizativo, mas técnico e científico.

E obviamente terá que se nortear pelas verdadeiras discussões do que é, agora, a sociedade portuguesa. Em minha opinião, balizada por três vertentes estruturantes:

a) a conjuntura de um Estado que assumiu responsabilidades sociais cuja manutenção parece inviabilizada face às capacidades produtivas e financeiras de um país europeu, mas periférico, desenvolvido, mas pobre, com cerca de 10 milhões de almas… Maioritariamente envelhecidas ou reformadas;

b) a mudança do paradigma das necessidades em saúde, marcado pelo peso progressivamente maior da carga de doença crónica e suas complicações e evolução, a par com as exigências terapêuticas e aumento, a todos os níveis, do consumo de recursos;

c) a erradicação de atitudes corporativistas que constituem elementos conservadores e retrógrados e a eliminação de complexos burocráticos e administrativos que entorpecem as administrações e as oportunidades.

A avaliação poderá ser um acto de fé.

Mas deverá construir-se em torno dum ciclo claro que integra o diagnóstico, a intervenção, a análise e assim sucessivamente, em busca de uma melhoria contínua.

Com a vantagem de, a ser bem praticada, dever despir-se da procura da culpa, do dever de julgar e censurar, suportada que está no benefício de poder ajudar a corrigir ou ensinar.

Para além disso, este trabalho poderia entrar em linha de conta com a obrigação de, uma vez por todas, levar a sério muito do que já foi concluído e debatido, concretizando em definitivo estratégias e “livros brancos” ou “verdes”, já escurecidos pelo tempo e sobretudo pela falta de vontades…

Refiro-me em especial a dois aspectos:

- o alinhamento do Plano Nacional de Saúde, neste caso o de 2012 – 2016, com as metodologias de contratualização, quer nos CSP, quer nos hospitais (logicamente com todos os indicadores seleccionados e ainda com as normas de orientação clínica preconizadas e homologadas);

- a garantia efectiva da continuidade e integração de cuidados, poupando aos cidadãos deslocações desnecessárias e repetidas ou inúteis, esperas ou duplicações de actos injustificados, custos exponenciais e até perigosos no tocante à segurança do doente, o aumento do número de camas hospitalares em detrimento do benefício desejável da domiciliação precoce dos pacientes e, enfim, reciprocidade e proximidade entre as estruturas de cuidados primários, hospitalares e continuados.

Sabemos que estes processos são sempre marcados por dificuldades práticas que as explanações teóricas e conceptuais não conseguem prever. Mas os tempos e as circunstâncias obrigam a um novo e melhor aproveitamento do que existe e está disponível…

Que imagem terão os cidadãos dos profissionais de saúde, quando estes são os primeiros a apontar questões e problemas, verdadeiros ou falsos, empolados ou não, que afectam as unidades e a colocar em causa a qualidade da dispensa dos cuidados prestados?

Que evidência existe que permita relacionar a aplicação sistemática de indicadores – muitos deles cristalizados pelo tempo e pelo uso – e o padrão de qualidade dos actos técnicos assistenciais com os outcomes resultantes da sua implementação (contratualizada)?

Que consequências teve ou tem o facto de se ter atingido hoje um número recorde de profissionais médicos e enfermeiros no SNS?

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SNS: para quando uma mudança win-win?
Editorial | Inês Rosendo, Direção da APMGF
SNS: para quando uma mudança win-win?

Não podemos ser indiferentes ao descontentamento dos médicos nos tempos que correm, nunca vi tantos médicos a dizerem pensar sair ou desistir do que construíram. Desde médicos de família que pensam acabar com as suas USF, por não verem vantagem em continuarem a trabalhar no sentido da melhoria contínua (e até sentirem que os desfavorece) até médicos hospitalares a querer deixar de ser diretores de serviço, sair do sistema público e/ou, até, reformar-se antecipadamente. Tudo o que foi construído parece à beira de, rapidamente, acabar.

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