As metástases ósseas são a principal causa de dor associada ao cancro, resultantes da disseminação de neoplasias localizadas em outras partes do corpo, tais como o pulmão, a mama, a próstata, o rim ou o aparelho digestivo, sendo que 60 a 84% dos doentes oncológicos padecem das mesmas.
Nesse sentido, em entrevista ao Jornal Médico, Vânia Oliveira, especialista em Ortopedia no Centro Hospitalar Universitário do Porto, esclarece que a evolução do tratamento desta patologia, bem como os esforços que têm sido feitos pelo Centro de Referência Nacional e Europeu em Sarcomas Ósseos e de Tecidos Moles, de forma a tratar mais e melhor. Passando ainda pela importância da referenciação após o diagnóstico de forma a ser adotado o tratamento mais adequado a cada doente.
Os ossos são a terceira localização mais frequente de metastização hematogénica, pois “as células tumorais circulam na corrente sanguínea e zonas como a coluna dorsal, fémur ou úmero tendem a ser mais irrigadas”, explica a especialista. Atualmente, “60 a 84 % dos doentes com cancro em estado avançado têm metástases ósseas”, porém, Vânia Oliveira reflete que a incidência cumulativa de metáteses ósseas varia amplamente dependendo do tumor primário e do estadio na altura do diagnóstico, mas podemos dizer que a próstata é o que apresenta maior risco, seguido do pulmão, mama e rim.
Em crescimento exponencial, as metástases ósseas, acarretam um elevado impacto clínico e psico-socioeconómico, associando-se a dor intensa com agravamento progressivo, fraturas e disfunções, podendo mesmo comprometer o sistema neurológico. “Isto afeta drasticamente a qualidade de vida dos doentes, culminando na incapacidade funcional nas tarefas diárias e dependência de terceiros”. Nesse sentido, “tem havido diversos avanços no diagnóstico e nos tratamentos oncológicos, permitindo que um doente com doença disseminada possa viver, proporcionando-lhe a máxima qualidade de vida”.
Combater o subtratamento das metástases ósseas, capacitar a MGF para a adequada referenciação
Atualmente, tem-se verificado o sub-tratamento das metástases ósseas. É, por isso, fundamental que estes doentes sejam orientados precocemente para Centros de Referência, com equipas multidisciplinares experientes nesta área, sendo para isso muito importante que os profissionais de saúde, especialmente da área da Oncologista e da Medicina Geral e Familiar (MGF), estejam familiarizados com estes procedimentos e resultados. Em Portugal, existem cinco centros acreditados de referência para tecidos musculoesqueléticos, reforça a especialista Vânia Oliveira.
Quando se fala em metástases ósseas, enquanto lesões secundárias, é “fundamental estar a tratar o doente de forma sistémica, em relação ao tumor primário, que está em circulação e, paralelamente ter o apoio da ortopedia para que seja possível adequar individualmente a estratégia mais efetiva”. “Temos a possibilidade de estarmos a participar em estudos multicêntricos nacionais e de estarmos na linha da frente em várias áreas. Fizemos vários estudos no âmbito das metástases ósseas e temos toda uma equipa multidisciplar focada no tratamento destes doentes, no Centro de Referência Nacional e Europeu em Sarcomas Ósseos e de Tecidos Moles, salienta.
Os especialistas de Medicina Geral e Familiar têm um papel “crucial na referenciação precoce e adequada” para que estes doentes possam dar início ao tratamento. Sempre sob um ângulo multidisciplinar, na qual a Oncologia nunca pode ser descurada, “o que queremos é sobrevida em função da qualidade de vida do doente”, refere. Vânia Oliveira salienta que “a esmagadora maioria ainda acaba por fazer radioterapia convencional”, porém, este é “um procedimento limitado”. 20 a 50 % têm resposta efetiva à radioterapia e é sempre uma arma muito útil durante a evolução da doença, mas, cerca de 20 a 30% nem sequer respondem de todo”. Além disto, importa ainda perceber se se está perante “uma metástase única ou oligometastases”.
Existe atualmente uma cirurgia minimamente invasiva que garante maior eficácia, segurança e precisão no tratamento – a ablação por radiofrequência. Este procedimento destrói as células tumorais aliviando a dor e melhorando a qualidade de vida dos doentes. Este é um procedimento com “90 a 100% de eficácia no rápido e significativo alívio da dor”. Esta é, ainda uma técnica que, “quando associada a outras técnicas das quais são exemplo o cimento - cifoplastia na coluna e cimentoplastia nos ossos longos, também nos vai dar um suporte estrutural que também tem uma ação química e, portanto, vai assumir um efeito sinérgico complementar para a obtenção de um controlo efetivo local”, acrescenta Vânia Oliveira.
A ablação por radiofrequência constitui assim uma alternativa a tratamentos convencionais, que incluem cirurgias mais agressivas, com elevados riscos e longo tempo de recuperação, ou esquemas de paliação da dor muitas vezes ineficazes e com efeitos colaterais nefastos. Nestes doentes em particular, pela sobrevida limitada e pela vulnerabilidade da imunossupressão, qualquer complicação ou recuperação prolongada terá um elevado impacto.
De acordo com Vânia Oliveira, foi verificado um rápido e significativo alívio da dor e melhoria funcional, com impacto na qualidade de vida dos doentes tratados. “Especialmente no caso das lesões na coluna vertebral, a inovação tecnológica tem sido uma enorme mais-valia, uma vez que já dispõe de sensores específicos, incluindo a refrigeração e sensor térmico, o que permite tratar a metástase com uma maior área de ablação e de forma mais segura e eficaz, otimizando o tratamento pretendido”.
A atual pressão que se coloca nos Cuidados de Saúde Primários (CSP) em Portugal é um presente envenenado para os seus utentes e profissionais de saúde.