Luís Cunha Miranda: “O SNS não tem uma estratégia para a dor crónica”
DATA
18/01/2019 16:28:47
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Jornal Médico
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Luís Cunha Miranda: “O SNS não tem uma estratégia para a dor crónica”

O papel da Reumatologia é determinante no prognóstico do doente e na estratégia correta de abordagem da dor crónica. Quem o diz é o presidente da Sociedade Portuguesa de Reumatologia (SPR), Luís Cunha Miranda.

“Sem um bom diagnóstico da doença subjacente à dor crónica, a única coisa que podemos obter é um mascarar de situações que poderão impactar na vida futura dos doentes”. O alerta parte do reumatologista Luís Cunha Miranda, que destaca o papel crucial da sua especialidade médica no contexto da dor.

Nas consultas de Reumatologia, a dor é sem dúvida a principal queixa dos doentes, encontrando-se, muitas vezes, relacionada com alterações nas articulações, músculos e tendões, bem como com doenças reumáticas sistémicas, nomeadamente, o lúpus, a artrite reumatoide, as espondilartrites ou a esclerodermia.

Relativamente aos grandes desafios no diagnóstico e tratamento da dor crónica, Luís Cunha Miranda destaca o acesso dos doentes aos reumatologistas, uma vez que estes profissionais de saúde assumem um papel muito importante nesta matéria. Note-se que, em Portugal, 56% da população não tem acesso à Reumatologia, situação particularmente crítica em alguns hospitais centrais (Amadora-Sintra, Civis, Santo António, Penafiel ou Cascais). Esta situação acaba por ter implicações elevadas em termos prognósticos. Por outro lado, para o especialista, as unidades de dor – essenciais no tratamento da dor oncológica – não são a solução, especialmente se não forem verdadeiramente multicêntricas e contarem com o apoio de diversas especialidades, nomeadamente da Reumatologia.

Sobre a oferta terapêutica ao longo dos anos, o reumatologista destaca que têm sido realizados grandes avanços no tratamento das doenças reumáticas, que consistem no controlo da atividade da doença a fim de se obter um controlo efetivo da dor associada. “Ou seja, não se pretende anestesiar o doente, mas sim controlar a doença de base, assim como a dor a ela associada”, esclarece Luís Cunha Miranda.

De acordo com o médico, “o Serviço Nacional de Saúde (SNS) não tem uma estratégia nem um plano para a maior parte das áreas terapêuticas [da dor crónica], ainda que existam planos contra a dor ou contra as doenças reumáticas, um plano nacional de saúde e múltiplas redes de referenciação hospitalar. Temos apenas planos nacionais ou parciais e redes de referenciação hospitalar para ficar bem no papel que não são minimamente eficazes ou até reais”.

Desta forma, o especialista defende que é preciso que os doentes tenham acesso à Reumatologia, pelo menos, nos hospitais de grandes dimensões. “A presença de unidades de dor sem uma verdadeira interdisciplinaridade serve apenas para dizer que há uma rede de unidades que não é capaz de resolver, de forma real e aceitável, o problema da dor crónica, especialmente a de origem musculoesquelética”, frisa.

Segundo Luís Cunha Miranda, a SPR tem lutado, ao longo dos últimos anos, pela melhoria de acesso dos doentes à Reumatologia, com a convicção de que esta medida poderá ter um impacto significativo no futuro e na qualidade de vida dos doentes reumáticos. De salientar que a SPR tem vindo a apoiar várias associações de doentes reumáticos, bem como a Liga Portuguesa Contra as Doenças Reumáticas, com o objetivo de apostar num trabalho multidisciplinar em benefício dos próprios doentes.

“Temos apostado, ainda, no conhecimento das doenças reumáticas com dor crónica no seu estudo e na sua monitorização quer através do estudo da SPR, o Epireuma, quer através de um registo nacional de nível mundial, o Reuma.pt”, refere Luís Cunha Miranda. Para o presidente da SPR, estas duas ferramentas são fundamentais para o conhecimento científico dos doentes e têm permitido fazer diversos projetos de investigação, ao mesmo tempo que potenciam o trabalho que tem sido feito nestes últimos 20 anos de atividade.

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Editorial | Joana Torres
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