Este estudo foi desenvolvido no âmbito do projeto ResiliScence 4 COVID-19, financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia e coordenado por Rui Gaspar, Docente e Investigador do Católica Research Centre for Psychological, Family and Social Wellbeing, em parceria com a Direção-Geral da Saúde, Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge, Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra, Ordem dos Psicólogos Portugueses e ISPA-Instituto Universitário.
A investigação centrou-se na análise do comportamento humano como fator central na evolução da pandemia, no sentido de o posicionar no centro das estratégias de combate a esta e a futuras crises de saúde pública. O estudo teve como objetivo compreender os fatores que podem influenciar a adesão dos cidadãos às diferentes recomendações de comportamentos de prevenção de contágio emitidas pelas autoridades de saúde, nomeadamente como os cidadãos respondem a uma crise de saúde pública e socioeconómica como a que carateriza a atual pandemia e como estes avaliam os acontecimentos ao longo do tempo.
Algumas das variáveis tidas em conta foram: as primeiras notícias vindas da China, a entrada do vírus na Europa e as consequências na emergência de preconceito e racismo, as exigências do 1º confinamento e a esperança no futuro durante o 1º desconfinamento, o aparente “normal” no verão e a perceção de risco no regresso à escola, a constatação do “não normal” em outubro e novembro e o aparente relaxamento do “efeito Natal”, seguido da perceção de perigo extremo associado ao maior grau de ameaça percecionada em Portugal desde o início da pandemia.
Esta avaliação foi analisada ao longo do tempo, com base em indicadores de como as pessoas percecionaram as exigências colocadas pela pandemia (perigo; esforço; incerteza) e os recursos de que dispunham para lidar com ela (conhecimento e habilidades; disposições; suporte externo).
Um conjunto de indicadores de perceção de risco (para a saúde pública, social, económico e saúde psicológica) foram avaliados em 87 períodos de monitorização de 4 em 4 dias desde janeiro de 2020 a janeiro de 2021. Foram analisados 120.267 comentários públicos de utilizadores de redes sociais, em resposta a publicações sobre Covid-19 emitidas pela Direcção-Geral da Saúde de Portugal e por sete meios de comunicação social nacionais (Expresso, TVI24, RTP3, SIC Notícias, Correio da Manhã, Público e Observador), com vista a emitir recomendações para uma eficaz comunicação de risco e comunicação de crise e mobilização social.
Globalmente, o nível de ameaça tendeu a refletir a situação epidemiológica de novas infeções e óbitos num determinado momento, mas foram também identificados períodos em que isso não ocorreu, com algumas expressões de incerteza ou desconfiança face à gravidade dos números comunicados ou perceção de um elevado grau de ameaça quando os números não o evidenciavam. Nas exigências específicas expressadas pelos cidadãos, os indicadores de esforço foram sempre predominantes face ao perigo e incerteza existentes na situação, o que confirma que a atual crise de saúde se tornou crónica, predominando a denominada “fadiga pandémica”.
O período em que a ameaça foi percecionada como mais baixa, coocorreu com os primeiros casos confirmados de Covid-19 em Portugal e novamente no único dia com zero óbitos. O maior grau de ameaça avaliada verificou-se em janeiro de 2021, em coocorrência com a mais grave situação epidemiológica desde o início da pandemia, acima do maior até aí verificado no período em que foram confirmadas medidas restritivas a implementar no Natal de 2020.
Após cada “período de crise”, em que a ameaça percebida aumentou consistentemente até atingir o pico, foi verificado um “período de restauração”, onde a ameaça percebida diminuiu consistentemente, atingindo os níveis médios do ciclo anterior.
Estes resultados podem indicar resiliência social e individual, indicando que após cada crise existe recuperação. Servem também, no entanto como alerta, dado que a repetição de vários ciclos de crise-recuperação pode levar a um incremento de fadiga pandémica e consequente maior tempo de recuperação após cada período de crise, caso não sejam providenciados recursos sociais e pessoais aos cidadãos, que tornem a recuperação mais eficaz.
Era 11 de março de 2020, quando a Organização Mundial de Saúde declarou o estado de Pandemia por COVID-19 e a organização dos serviços saúde, como conhecíamos até então, mudou. Reorganizaram-se serviços, redefiniram-se prioridades, com um fim comum: combater o SARS-CoV-2 e evitar o colapso do Serviço Nacional de Saúde, que, sem pandemia, já vivia em constante sobrecarga.